segunda-feira, maio 29, 2006

Construir organizações aprendentes

Este modelo nasceu da observação do que se passa em algumas ONG's e, sobretudo, da leitura critica de alguns livros, de entre os quais se destaca o The fifth discipline de Peter Senge[1]. Não se trata de um modelo experimentado, antes é o produto de uma reflexão pessoal bastante teórica.

Nele tentei reflectir como é que uma pequena equipa pode tirar partido da aprendizagem organizacional. Trata-se de um modelo circular em três grandes passos: intervenção, isto é, a experiência quotidiana da equipa; integração, isto é, a partilha de percepções, dados e informação entre os membros da equipa; e estruturação, isto é, a criação de regras de intervenção

Este modelo simples pretende permitir às pequenas organizações e equipas tirar partido das vantagens da aprendizagem organizacional. Em particular a capacidade de inovar é crucial no desenvolvimento local; pois, sendo uma das correntes do desenvolvimento alternativo, não existem respostas pré-concebidas aos problemas. O empenho da equipa é outras das vantagens da aprendizagem organizacional; como diz Senge uma organização aprendente reconhece-se pelo entusiasmo dos seus colaboradores.

O pressuposto base deste modelo é que a principal fonte de informação é a experiência quotidiana dos membros da equipa ou pequena organizações tratada. Aliás, Choo[2] nota que a maioria dos estudos empíricos concluem que os gestores preferem informação vinda directamente dos seus colaboradores, à produção académica ou outro material escrito. O principal motivo encontrado para tal é a possibilidade de se estabelecer um diálogo entre o utilizador de informação e a "fonte", permitindo pesquisar as dimensões ocultas da informação.

Intervenção

A intervenção é o trabalho quotidiano da equipa ou pequena organização em causa é o elemento fundamental deste modelo de aprendizagem organizacional. A experiência quotidiana dos técnicos é rica em experiência e informação. Este modelo está estruturado para tirar partido dessa informação.

O feedback da intervenção é pois, como mostra o esquema, o elemento central do modelo. Esse feedback deve centrar-se na qualidade das actividades desempenhadas pela equipa. Essa qualidade avalia-se a dois níveis: nos seu resultados, ou seja, a capacidade de produzir mudança nos beneficiários dessas actividades; e na satisfação que os beneficiários obtêm com essas mudanças.

Neste contexto, há que ter em conta que existe toda uma paisagem organizacional em torno da pequena organização aprendente ou equipa. Os seu beneficiários subdividem-se em vários grupos, dependendo da estratégia da organização. Mas não é só com estes que nos devemos preocupar. Garantir a satisfação dos clientes, ou financiadores, e parceiros da organização também é importante para a sustentabilidade organizacional da pequena ONG. Isto implica, que para cada grupo e subgrupo de actores se forme uma cadeia de relações entre as actividades, resultados e satisfação diferente e que tem de ser atendida.

Integração

Em resultado da experiência quotidiana de cada um dos membros da equipa, dispõe-se de uma grande quantidade de informação dispersa que é útil à actuação da organização. A maior parte destes conhecimentos permanecem a nível tácito. Necessitamos então de uma estratégia que permita partilhar e integrar estas informações num conhecimento comum. Estamos a falar da construção de uma visão partilhada da realidade onde a equipa ou pequena organização intervêm.

Ao contrário do passo anterior isto só acontece se for propositadamente planeado. Existem vários métodos que podem facilitar esta partilha: diagnóstico prospectivo ou análise de cenários; future search; etc. A análise SWOT serve para responder a questões pontuais. É importante planear como fazê-lo, e sobretudo ter em conta que cada colaborador tem informação útil à gestão da organização. Esta é uma informação muitas vezes não partilhada, em particular pelos colaboradores que estão mais afastados da direcção.

O plano estratégico é o produto do físico da integração. Contudo, pouca gente lê planos estratégicos; e é necessário que os sintam. Por essa razão o plano estratégico deve ser um documento em construção de modo a que cada colaborador contribua regularmente para ele, o sinta como seu, se aproprie dele e o use para conduzir o seu trabalho. A experiência de partilha de opiniões durante uma revisão do plano estratégico torna-se mais importante que o plano redigido em si. No planeamento estratégico, a velha ideia que mais importante que o plano é planear é ainda mais verdadeira.

Estruturação

A produtividade de uma equipa aumenta com o estabelecimento de regras de comunicação entre os seus membros. A estruturação é isso mesmo: buscar regras e procedimentos que melhorem a performance da equipa. Essas regras e procedimentos serão elaboradas que acordo com a visão partilhada da equipa.

Existem várias razões para investir em regras e procedimentos dentro de uma pequena equipa. A primeira provém do facto de se trabalhar em equipa: é que o mesmo trabalho vai passar de mão em mão entre os membros da equipa, e estes vão integrar-se melhor no trabalho se este for conduzido de acordo com regras previamente acordadas. A segunda é evitar o custo de inventar a roda todos os dias; ou seja, a solução que se identificou como boa num trabalho similar anterior, é reutilizada e aperfeiçoada de acordo com as novas necessidades. Um dos maiores desperdícios de tempo em gestão de projectos, que é a maior parte do trabalho de uma ONG, advém da não resolução destes factores.

E estruturação pode fazer-se com base em 2 tipos de procedimentos: protocolos e templates. Protocolos descrevem a conduta dos membros da equipa num determinado tipo de situações. Estes protocolos podem ser listas de regras estabelecidas, como por exemplo, como mandar determinada informação à imprensa; ou listas de verificação onde estão itens que têm de ser atendidos em determinadas situações. Os templates são fichas onde se ordena determinada informação: a ficha de discrição de projectos e actividades são muito comum numa ONG. Para além de fichas esses templates podem ter também o formato de tabelas. A figura abaixo é um tamplate que pode ajudar à distribuição de tarefas dentro de uma equipa.

Os templates são a melhor maneira de evitar "inventar a roda". Na descrição de um projecto, o membro da equipa que teve a ideia tem de decidir qual é a informação essencial para explicar o projecto em poucas palavras e de que modo ordená-lo. Ao mesmo tempo, a informação útil para pessoa que vai aprovar ou desenvolver a ideia de projecto pode não ser a mesma que a pessoa que concebeu a ideia considerou. Se existir uma ficha de projecto, com um formato previamente definido de como apresenta-lo, é tempo poupado.

A introdução de mecanismos de estruturação numa equipa deve ser paulatina, e estes têm de ser o mais possível elásticos para serem melhorados com o uso. Se estas duas condições não se verificarem, podem dar origem a entropia e confusão e complicar mais o trabalho que simplificar. Há medida que a equipa vai concebendo as suas regras operacionais, o funcionamento como equipa vai tornando-se mais ágil.

Integrando mais informação

O modelo apresentado toma a experiência quotidiana dos membros da equipa ou pequena organização como principal fonte de informação da aprendizagem organizacional. No entanto, este modelo deve ser complementado com algumas estratégias que permitam complementar essa informação. Assim, apresento uma lista cura de ideias do que essas estratégias podem ser:

  • Contratação de estudos específicos

Para temas muito específicos e importantes que condicionam a actuação da equipa ou pequena organização, o recurso à contratação de consultores para a realização de estudos específicos é uma solução. Por exemplo, o estudo da paisagem organizacional da intervenção da organização, no caso de uma ONG é importante.

Obviamente estes estudos podem ser levados a cabo por pessoas da equipa, mas na maior parte dos casos não; por duas razões: o grau de especialidade do estudo pode ser elevado; ou (mais frequente) os seus membros não têm tempo para se dedicar a ele. Dependendo da situação se elegerão os critérios de selecção do consultor. Em muitos casos o recurso a finalistas de licenciatura ou mestrandos que buscas casos de estudo para a elaboração da sua tese pode ser uma opção barata e eficaz.

  • Organização de seminários

A análise das tendências globais e a apresentação de novas metodologia, em particular as primeiras, são essenciais para uma organização. É difícil que os seus membros se ponham a par destas tendências e inovações porque isso implicaria uma pesquisa demorada. Uma pequena organização pode recorrer à utilização de seminários e conferências temáticas. Durante as conferencias os membros da organização podem tomar conhecimento dessas tendências. É, no entanto, necessário afirmar que tais conferencias e seminários só contribuem para a construção da organização aprendente quando se centram em necessidades de informação previamente identificadas pelos membros da organização.

E uma vantagem associada a estas actividades é que, quando bem planeadas, são lucrativas.

  • Cursos de formação

A forma mais clássica de introduzir conhecimentos nos membros da equipa ou pequena organização é a formação. Esta formação deve ser planeada de acordo com as necessidades dos seus membro, como é óbvio.


[1] SENGE, Peter - The fifth discipline: the art & practice of learning organization. London: Currency Doubleday, 1990.

[2] CHOO, Chun Wei - Gestão da informação para a organização inteligente. Lisboa: Caminho, 2003.

Sem comentários: